domingo, 17 de agosto de 2008

Serra da Ibiapaba



Serra da Ibiapaba
Clara Leda


A Serra da Ibiapaba ou Serra Grande é um conjunto de gigantescas e harmoniosas elevações que parecem eternizar seu contemplamento sob a linha do horizonte.

Ostensivamente bela, sua exuberância é proveniente da rica vegetação que, espaçosamente, derrama-se sobre altos e baixos, esculpindo ondas intermináveis que transformam o relevo numa paisagem sui generes, onde o ar embriagador das montanhas sai a campear. Nos baixios, orquestrando os canaviais, nas encostas, o palmeiral.

Sobre suas planícies nasceram oito cidades, geograficamente irmãs nos atributos naturais. Têm solo fértil, recursos hídricos e climáticos, grande diversidade de flora e fauna.

Em comum também suas origens. Terras, inicialmente, ocupadas por nações túpicas, como os Tabajaras, raça de guerreiros inteligentes e únicos habitantes das ricas terras ibiapabanas. Poucos anos após o descobrimento do Brasil, por lá aportaram os primeiros colonizadores, como os pernambucanos, franceses, portugueses e os padres Jesuítas. O aldeamento foi se organizando. No séc. XVIII surge a primeira vila passando a condição de cidade no século seguinte.


Viçosa do Ceará foi a pioneira e por conseguinte abriu caminho para o desenvolvimento da Serra Grande. Visitá-la é ter a oportunidade de excursionar no seu passado, apreciando o rico patrimônio arquitetônico do período colonial, a citar: a Casa onde nasceu o jurista Clóvis Beviláqua, criador do primeiro código civil brasileiro, transformada em memorial; o Solar da família Pinho Pessoa, com cento e sessenta e cinco portas e janelas e a acolhedora Igrejinha do Céu. Um dos acessos a esse templo é por uma subida de trezentos e sessenta e cinco degraus largos e brancos. Ao longo do percurso estão as estações da Via Sacra. No topo da colina se ergue a igreja que contemplativa, permanece, incansavelmente, a admirar, em baixo, a cidade sobre um extenso tapete verde. Em cima, nas proximidades, o firmamento azul acetinado. Aos arredores estão praças e jardins arborizados, com rosas de espécies e cores variadas, forrados por um gramado, impecavelmente zelado. Há também restaurantes e um centro comercial que oferece produtos da lavra, como artesanato, doces, licores, numa diversidade possível a atender todos os gostos.

Outra atração é o turismo ecológico. Através de caminhadas por trilhas chega-se a Bica do Itarumã, que oferece condições ideais para a prática de rapel, e a Pedra do Itaburuçu tal qual uma laje, a cem metros de altura, forma um abrigo natural.

Tianguá foi agraciada com a cachoeira das sete quedas, de singular beleza. As sucessivas cascatas são alimentadas pelas águas límpidas que descem pela encosta das serras.

No Parque da Floresta está a Cachoeira do Amor. Uma porção d’água sai de uma densa mata e cai lentamente em um lago. O local é aprazível, de peculiar encanto e tem a magia de envolver os visitantes em suas manhas.

Ubajara é o mais importante pólo turístico da Ibiapaba nele está o Parque Nacional de Ubajara, considerado Monumento Natural, abrigando, principalmente, a Gruta de Ubajara, a duzentos e cinqüenta e três metros acima do nível do mar, no Morro da Fada.


Para chegar a gruta se tem duas opções: uma é descer pela trilha de pedra, construída pelos índios. É uma aventura que permite variadas paisagens numa travessia penosa, de aproximadamente duas horas, mas repleta de emoção. A outra é pelo teleférico, igualmente uma aventura proporcionada pela descida íngreme, de curtíssima duração.


Conhecer a gruta é fazer uma viagem por corredores e salas subterrâneas onde o calcário, talhado pela erosão, enfeita cada compartimento com adornos semelhantes a rosas, cortinas, gravuras de animais, índios e retratos de pessoas. Esse compêndio artístico a torna museu.


Pelas trilhas chega-se ao mirante, um observatório arredondado, construído com tábuas de madeira, suspenso na lateral de um precipício. A vista é indescritível!


Cachoeira do Cafundó


Cachoeira do Frade

Prosseguindo, encontramos, por vez, as quedas d’água do Gavião, do Cafundó, da Gameleira e do Veado Quebrado. Na zona de carrasco, a do Frade e o balneário do Boi Morto. Ibiapina fica logo depois de Ubajara. Nove quilômetros é a distância que as separa. Seu turismo ecológico é realizado através de veredas estreitas e sinuosas que vão à Cachoeira do Pajé, à Bica do Monte Belo e a um mirante de onde o olhar vagueia e se perde nas vistas dos vales em descidas e subidas suaves, cobrindo de verde a encosta ibiapabana.

O Buraco do Zeza, no sertão, é uma seqüência de sete cachoeiras volumosas, singidas, por um lado, pela muralha montanhosa e por outro, pela mata virgem. A mais alta delas tem, aproximadamente, trinta metros. A água é lançada através de um monumento de pedras, sobrepostas aleatoriamente. A corredeira larga, continua por mais uns cem metros e novamente cai em outro precipício de menor altura e vai embora, deparando-se, lá mais à frente com outra e mais outras descidas. Desce festiva ecoando um canto bandeirante. São Benedito é a capital cearense das rosas. No distrito de Inhuçum está instalada a Cerosa a mais estruturada floricultura desse Estado.

Trilhas primitivas dão acesso a duas cachoeiras de singular beleza, a de São Cristóvão e a do Buraco da Velha. Ao longo de suas estradas estão as casas de farinha, os engenhos de cana de açúcar e os carros de boi. Em Guaraciaba do Norte está a Cachoeira dos Morrinhos e a Cidade de Pedras, imensas formações rochosas talhadas pelo sopro do vento, das tempestades e pelas chuvas.


Cachoeira de Morrinhos

Carnaubal é banhada pelo Rio Inhuçum cujas margens são decoradas por belas formações rochosas. Esse é seu principal atrativo turístico. Ao mesmo município pertencem as cachoeiras do Sítio do Parque das Águas e o Balneário Cachoeira Park.


Biaca do Ipu

Ipu está encravado no sopé da Serra e liga o Sertão Central à Serra da Ibiapaba. A Bica do Ipu é sua principal atração e um grande cartão postal. Cai de uma altura de cento e trinta metros e é conhecida no Brasil e no exterior por ter sido focada com inspiração no romance Iracema, escrito por José de Alencar.

Assim se compôs a Serra Grande. Seis de suas cidades receberam simpáticas denominações indígenas, como Ubajara, que significa homem da canoa e Ipu, queda d’água. Ambas nasceram nos arredores de uma igreja, possuem o mesmo clima, terras vazadas por olhos d’água que abastecem rios e cachoeiras, farta vegetação e um povo tranqüilo resultado de uma relação bem construída. Quando longe, a saudade corrói o peito e nenhum outro lugar é capaz de fazer esquece-la. As doces lembranças vêm a tona e sua gente descobre maravilhada que a cordilheira hospeda no seu peito o coração do Brasil.

Fonte:Jornal O Povo

VILA UNIÃO - Vila do sossego

Angélica Feitosa
da redação


Na boca dos moradores, o Vila União é descrito como bairro tranqüilo. Muita gente na rua a partir do final da tarde e à noite. Passeio na lagoa, futebol na praça, conversar sobre a vida no banco da igreja

O bairro Vila União existe desde 1940 e reúne quase 15 mil habitantes, cerca de muros, fica na rota dos aviões e comemora a paz que impera no bairro (Foto: ALEX COSTA) Mãos enfiadas nas chinelas japonesas. Palma protegida pela borracha, dedão e indicador de um lado da tira, os três restantes do outro. O menino ajeita o boné para trás enquanto, atento, se agacha e espera o ataque. Olho na bola e nos pé do adversário que se aproxima, ele se prepara. Um garoto chuta forte, o goleiro pula, espalma, pra fora. "Uuuuuu". Grita uma ruma de menino na beira da grade, tudo time de fora. "Béisso, macho, porque tu não passou pra mim?", reclama alguém do outro time, enquanto o goleiro joga pra cima o chinelo.

A pracinha do Vila União junta gente toda noite. A quadra em frente à Igreja Jesus Maria José é disputada. Por isso, tem menino que emenda do final da aula direto pra lá. "Meu pai conta que isso tudo aí era um matagal, até antes de ser um campo", joga da calçada de casa Antônio Augusto, 48, nascido e criado no bairro, em frente à praça. No muro e pintado de azul, o escrito "Zé do Buzo - Informador de ruas" ficou de registro, mesmo depois da morte do pai de um ataque cardíaco à beira da Lagoa do Opaia, em outubro passado. José Maria, o Zé do Buzo, era o maior conhecedor do bairro e a pessoa mais conhecida também. "Podia ser onde fosse, se dentro do Vila União, o pai sabia informar. De fora, dos derredores, também".

"Mas, menina, morar aqui é bom demais", se aproxima Lúcio Castro Júnior, apertando a bicicleta na área da casa de José Augusto. "Tudo que é bairro, você tem medo de andar. Aqui não. Você pode é amanhecer o dia nessa praça que ninguém mexe com você. O pessoal volta do trabalho e passa a noite toda aí, bebe umas canas, mas é tudo tranqüilo. Olha pra lá!", aponta para as crianças andando de bicicleta, rodeando a igreja. De noite, no Vila União, é gente na calçada em quase todas as ruas, compostas em maioria por casas térreas e alguns poucos sobrados. A concentração é maior no pólo de lazer construído à beira da Lagoa do Opaia e na praça que carrega o nome e a estátua de um antigo vereador, Aroldo Jorge Vieira.

No caminho do pólo, um corcel cupê 77 branco enfeita uma pequena lanchonete, numa casa de alpendre. É destacado pela parede azul, lustrado e brilhoso. Fica exposto e ninguém bole. Como esse carro foi parar aí? "É o que todo mundo pergunta", ri seu Francisco Paulo da Silva, 54, mecânico de uma empresa de ônibus, assistindo à televisão da sala de casa dividida com o ponto comercial. O carro virou chama para a lanchonete. "Faltou dinheiro para consertar. Tá aí, parado faz dois anos".

À Beira da Lagoa
O avião decola justamente na hora da notícia que seu José Maria Alves, 63, quer assistir. A melhor parte do noticiário quase sempre é interrompida pelo ronco estrondoso das aeronaves partindo das costas do aeroporto, na pista de decolagem colada com a casa do cambista. "É na hora que vai dizer o nome do cabra de morreu. É só um zuuuum. Tem que correr, pra aumentar o volume, senão perde". Seu Celinho se aprochega e revela mais uma faceta de se morar próximo ao aeroporto. "De madrugada, passa na mesma hora um avião. A gente já sabe que são três horas da manhã".

Os dois costumam ocupar as tardes à beira da Lagoa do Opaia, na margem próxima ao muro da Base Aérea. Nesse lado, o calçadão é irregular, quebrado e sem bancos, bem diferente da outra beirada, onde o fica o pólo de lazer. Uma belezura! Parquinhos espalhados ao longo da margem da lagoa, muita gente fazendo caminhada, adolescentes sentados em banco, churrasquinho e milho verde. "O lazer daqui é assim. Sai pra calçada, fala da vida, caminha, brinca nas quadras, não falta o que fazer não", aponta seu José Maria. "Mas, menina, tu percebeu? Quem vier para cá, não tem saída, tem que voltar", emenda o cambista, referindo-se ao muro da Base que envolve todo o oeste do bairro. Zé Maria antes de montar a banca para quem faz uma fezinha, foi motorista da Vila União, que junto ao Via Expressa/ Lagoa, formam as duas únicas linhas a passar pelo bairro.

"Aqui é seguro em quase todo o canto, até no Carandiru. Só não é pelo lado ali dos ricos, entre a (avenida dos) Expedicionários e a (avenida) Luciano Carneiro", aponta Larícia Julião, 13 anos, da pracinha do Vila. "Lá não tem um pé de pessoa na rua, é esquisito, você fica com medo". O "Carandiru" ao qual a garota se refere é, na verdade, o apelido do Planalto Universo, um condomínio que há quase cinco anos abriga os ex-moradores da área de risco que existia à beira da Lagoa do Opaia e da comunidade Maravilha, antes da reurbanização. São 648 famílias que vivem em blocos uniformes, amarelos ou cor de rosa, de janelas azuis ou amarelas também. A partir da Via Láctea, principal corredor, planetas, estrelas e satélite nomeiam as ruas do conjunto. Marte, Urano, Neturno, Sol e Lua.

"Eu acho que existe preconceito com a gente. Só em chamar de Carandiru, né? Quem é que gosta que sua casa seja comparada a um presídio?", fala Aurilene Tavares, moradora da Saturno, com a filha e o esposo. "Quando vou ao supermercado e perguntam onde moro para a entrega, eles dizem: 'Ah, no Carandiru', eu digo, 'Não, lá é Planalto Universo', tem que cortar!".

Pequenos mercantis em cada uma das ruas do bairro, inclusive na linha do trem. Vizinha a uma mercearia de frente ao trilho, uma senhora senta num banquinho, enquanto a filha de cara amarrada baixa a cabeça, para a mãe alcançar a nuca. Os cabelos arrepiados estão partidos em dois. A mãe aproveita o resto de sol, entrelaça os dedos pelos fios, procura mais um pouco. Achou. Coloca o bicho no cimento. Mata o piolho com a unha. Procura mais um pouco. Puxa forte as lêndeas presas aos fios. "Aiii, mãe", grita a menina. "Vem cá, só mais um, tá já acabando".


PERFIL
Fundação: 23 de agosto de 1940.
Área: 217,50 ha
População: 14.882
IDH: 0,556 (médio)
Área de risco: Comunidade da Infraero

Fonte: Jornal O Povo

Conjunto Esperança - No pagote do geladão

Amanda Queirós
da Redação


Para chegar ao Conjunto Esperança, leva-se pelo menos uma hora de ônibus. A viagem dá o tom de cidade de interior que ainda permeia o lugar

O polo de lazer do lazer do Conjunto Esperança que os moradores chamam de praça é o lugar que quem mora nas casas e nos apartamentos construídos no bairro (Foto: ALEX COSTA) A rua é asfaltada, mas carece de sinalização. A praça também resiste, apesar dos bancos quebrados e da grama estorricada pelo sol. O comércio apinha-se sobre as calçadas desordenadamente e quase transborda para fora delas enquanto a poluição visual bagunça a vista de quem pretende se orientar por ali. Esse ensaio de caos contrasta com o cheiro de interior exalado pelos moradores do Conjunto Esperança. Inaugurado em 1980, o bairro guarda certa herança dos anos em que tinha mais cara de sítio do que de cidade tamanha era a distância para se chegar ao centro de Fortaleza. A qualquer hora, não falta gente na rua e é raro cumprir um trajeto sem parar três ou quatro vezes para cumprimentar conhecidos.

Algumas dificuldades também permanecem. Ainda hoje, somente três linhas de ônibus conectam o bairro com os demais durante o dia. Pelo menos a paisagem do trajeto sofreu interferência o suficiente para entreter a vista de quem é obrigado a esquentar o assento do coletivo nas várias horas gastas para ir ao trabalho e voltar para casa. Há 20 anos, prometeram construir ali uma estação de metrô que deixaria tudo mais perto. Até agora, só se viu areal e a menção de um viaduto para driblar os trilhos.

Apesar das semelhanças com o passado, muita coisa mudou. Não há mais sensação de segurança como antes. Nenhum morador se vê voltando sozinho, a pé, de madrugada, de uma festa. Quem está acostumado com o lugar joga a culpa da violência nos vizinhos do entorno. Outro aspecto diferente é arquitetônico. As casas, antes todas iguais e sem muro algum, ganharam identidade própria ao longo dos anos. O térreo dos apartamentos deu lugar ao comércio e o aperto dessas construções se aprofunda com a profusão de negócios 2 em 1 - como o salão da Marlene, que promete alisamento e relaxamento de cabelos e tira mais uns trocados com uma banca de frutas montada logo à frente - ou mesmo com algo no estilo de Seu Torquato, que mistura a casa à mercearia para vender de palha de vassoura a bainha de peixeira. Tudo isso contrasta com as avenidas largas que delineiam o axadrezado dali e servem como sala de aula para as auto-escolas da região.

O Conjunto Esperança é um bairro relativamente pequeno. As casas estão instaladas em ruas identificadas por números que vão de 101 a 114. Perpendicularmente a elas, em ruas batizadas com letras do alfabeto, ficam os apartamentos - na verdade, prédios baixos de térreo e primeiro andar. Conta-se de uma grande rixa entre "a turma das casas" e "a turma do pombal", como era apelidada a galera dos apartamentos. O socorrista José Maria Monção, 45 anos, vive na região desde a adolescência e atesta a rivalidade. "A gente chamava de pombal porque eles se achavam melhores só por morar mais alto. Eu namorei pelo menos uma menina de cada rua, da 114 até a 101, e quando comecei a namorar uma moça do pombal, tinha que desconversar de onde vinha para não ser expulso dali", lembra ele, rindo.

Esses dois mundos convergem no Pólo de Lazer construído anos depois da fundação do bairro. Ninguém chama o lugar pelo nome. Para todo mundo, aquilo é praça. Uma turma improvisou uma cesta de basquete e a pendurou num poste. Já as senhorinhas dão voltas e mais voltas no espaço em busca de saúde. Nas noites, o espaço vira ponto de encontro para todas as idades. Gente de bairros vizinhos, que não têm equipamentos culturais, se desloca para papear e terminar o dia na brisa dali.

O pólo contém ainda um enorme campo de futebol e um palco todo pichado onde, vez por outra, ocorrem eventos da Prefeitura. A estrutura é tão grande que ofusca a existência de uma Igreja logo atrás e remodela o esquema praça-igreja interiorano no qual o templo tem mais destaque que a área pública. É também ao redor dali que se instala o principal point juvenil do Conjunto, o Geladão. O lugar era apenas uma lanchonete até o dono fazer um puxado e promover rodas de pagode e swingueira nos fins de tarde de domingo. O ingresso sai a R$ 2 e, nos dias mais badalados, homens entram com R$ 4 e mulheres, com R$ 2.

De acordo com o estudante Silas dos Santos, 13 anos, a festa bomba tanto dentro quanto fora. Como o local é apertado, muita gente prefere abrir o bagageiro do carro e comandar a própria batida do outro lado só aproveitando o zum-zum-zum alheio. Antes do surgimento do Geladão, o espaço que mais concentrava jovens, nos anos 90, era o Pinheiro Clube. A festa dali teve diversas fases. Rolou forró, música alternativa e, mais para o fim, funk ao estilo "pancadão". A balada começou a ficar pesada e, vez por outra, rolava tiro. A casa fechou e hoje se transformou em um templo da Igreja Universal do Reino de Deus.

Esse arsenal de diversão ainda é muito pouco para quem vive no Esperança, mas é suficiente para fazer os moradores criarem relações mais próximas com o bairro. Antes, para os mais novos, morar ali era só uma questão de tempo até se conseguir um lugar mais perto do centro. Hoje já tem gente querendo é voltar pro bairro onde foi feliz e não sabia.



PERFIL

População: 15.291
Renda média por chefe de família: R$ 419,13
Tamanho: 110 ha
Distância do centro: 13,7 km
IDH: 0,448

Fonte: Jornal O Povo

PAUPINA - O limite de Fortaleza

Tiago Coutinho
da Redação


Apesar de se gabar de ser um dos bairros mais antigos de Fortaleza, a Paupina se popularizou na cidade, principalmente, depois da criação da Topic 03. O local, de difícil acesso, vive resquícios de uma cidade esquecida

Mosteiro de São Bento, na Paupina. Os moradores se reúnem no lugar para ver a queima de fogos na passagem do ano(Foto: Mauri Melo) Chegar à Paupina não tem mistério. Entra na Topic 03 e pede para descer no fim da linha. Pronto. Caso vá conhecer de carro é arriscado se perder. O bairro, sem ironia, já quase não é Fortaleza. Localiza-se na fronteira do Eusébio. As tapioqueiras são as referências mais antigas. Mas cuidado, não são aquelas tapiocas da Washington Soares de diversos sabores e adereços. As da Paupina são mais grossas, sem recheio, feitas pelas mãos de Dona Maria do Socorro, 52, na base do coco e goma, apenas.

Socorro herdou o ofício de tapioqueira do pai, o finado João Inácio, precursor da venda de tapiocas na estrada antiga para o Iguape, Prainha e Morro Branco, no tempo da piçarra, hoje avenida asfaltada Barão de Aquiraz. "Eu prefiro ficar no meu cantinho mesmo. Naquelas tapioqueiras mais famosas, a briga é muito grande. Aqui, não. É tudo calmo. Vivo bem e tranqüila, com a minha freguesia", desdenha Socorro. De antigo e tradicional, destaca-se também o Mosteiro de São Bento. No topo da Paupina, sob o comando de Dom Beda Pereira de Holanda, o espaço sagrado existe há 15 anos. Quase exótico, o local celebra, aos domingos, a missa gregoriana, cantada em Latim, com público de aproximadamente 500 pessoas de vários outros bairros.

Do alto do templo, a cidade se alarga. Do lado direito, vê-se o Eusébio. Do lado esquerdo, um paredão de prédios, também chamada de Fortaleza. Na vista da frente, a Lagoa da Precabura, limite entre os dois municípios. O Mosteiro, para os moradores, torna-se mais atrativo no último dia do ano. "Como é muito alto. Muita gente vem para cá no dia do Réveillon. Dá para ver os fogos de artifício de toda a cidade. Fica bonito. É uma forma de lazer daqui", comenta Marcondes Rodrigues, 49, consultor de empresas e morador da Paupina há 13 anos. Ele não é, nem poderia ser, o mais velho morador do bairro. "A Paupina é mais antiga do que Fortaleza, do que Messejana. Era parte de Aquiraz, tem mais de 400 anos", gaba-se. Dom Beda confirma as informações. Nos documentos do mosteiro, consta que ali foi, no século XVI, um ponto de evangelização no Ceará. E da fé vem uma versão para o batismo do bairro. "Os índios não conseguiam pronunciar o nome do Padre Antônio Pinto. Falava Pai Pino, com o tempo virou Paupina", pondera o reverendo.

A Paupina fica no limite de Fortaleza, ao lado da Messejana. Ela é o limite, também, de uma cidade apartada. Até a década de 90, a cidade ignorava a região. "O pessoal perguntava onde você morava, você dizia Paupina e vinha logo alguém brincar: 'Onde?'. Ninguém sabia que existia", explica Marcondes. Parte da população do bairro se origina de ocupações urbanas. Basta caminhar um pouco e ver pequenos mutirões, na base de terrenos ocupados. Quando Marcondes comprou sua casa, não havia asfalto em nenhuma rua. Pelo seu envolvimento com os movimentos sociais, ele conhece muito bem a história recente da localidade.

Mesmo entusiasmado e bairrista, no melhor sentido do termo, ele não consegue esquecer as carências do local. Além da Topic 03, há apenas mais um ônibus que assiste o bairro. A linha, também chamada Paupina, demora cerca de 40 min. Lá, também não possui bancos, nem supermercados, nem lojas de móveis ou eletrodomésticos. Há apenas um posto de saúde.

"Muitos dos moradores, portanto, tinham ou têm vergonha de dizer que moram na Paupina e preferem escrever em seus endereços Messejana", explica Marcondes. Como opção de lazer, os moradores escolhem entre banhos - no fim de semana - na Lagoa da Paupina e alguns campos ou quadras de futebol espalhados pelo bairro. As necessidades são supridas principalmente na Messejana.

O nome Paupina popularizou-se nos últimos anos do século XX. A costureira Salete Queiroz, 59, vinda para o bairro nos esquemas de ocupação ainda na década de 70, acredita que com a implantação da Topic 03 e da Rádio Paupina FM, a localidade se impôs à cidade. Ela, que também participou da criação da rádio, não tem falsa modéstia. "Foi um sucesso. Ajudou também que os moradores tivessem orgulho da Paupina. O povo dizia assim: a Paupina é melhor do que os outros, porque até rádio própria a gente tem", saúda.

Extinta, por questões judiciais, em 2006, a Paupina FM 104,9 foi uma Rádio Comunitária que teve sintonia por oito anos e expandiu as fronteiras. Moradores de Maranguape e Eusébio cantaram juntos. Com uma programação lúdica e social, ela trazia atrações musicais do brega ao reggae, além de discussões mais sérias sobre problemas locais. "A gente andava pela rua e todo mundo comentava a rádio. Ainda hoje as pessoas perguntam se nós vamos voltar", diz Salete. A rádio foi uma semente no sentimento comunitário na região. A partir dela, além do orgulho de ser da Paupina, houve mais organização no local.

O empenho atual dos moradores está em garantir o funcionamento da feira semanal, iniciada há cinco meses. Numa média de 50 feirantes, vende-se de tudo. Do peixe fresco ao controle remoto da tevê, carro-chefe da banca do Elivandro, 28. Logo vizinho, vem a barraca do Evaldo, 28. Lá, as mercadorias custam um real: bacia de tangerina ou de goiaba, penca de banana, saco de maçã. A feira acontece às quartas-feiras. Traz também opção de confecção, pastel, bolo. A feira funciona como um ponto de encontro dos moradores e dos cachorros, livres das coleiras.

Como principal meio de comunicação, atualmente existe apenas a comunidade no Orkut, com 732 integrantes. O objetivo do dono é chegar aos mil. Ainda longe do sucesso da rádio. O diálogo virtual consegue mexer com a dinâmica dos que possuem computadores ou dos freqüentadores das 10 lan houses existentes. A enquete do momento no site é "O que você acha de uma TV On-Line na Paupina?". Por enquanto, 50% das respostas estão na opção "A Paupina precisa ser vista pelo mundo, gostei!". A TV On-line é um novo sonho de Marcondes, ex-integrante da rádio. Ele mesmo afirma que não curte pensar no passado, mas no Futuro. E pensar grande. Quem sabe, em breve, o mundo enxerga a Paupina. E os moradores trocarão os controles remotos comprados na feira, por mouses e teclados.


PERFIL

População: 18.499
Localização: Regional VI Tamanho: 837,50 hectares
Distância do Centro: 16,8 Km

Fonte: Jornal O Povo

FLORESTA - Floresta à vista

Henrique Araújo
especial para O POVO


Espremido entre uma grande fábrica de transformadores e a Lagoa do Urubu, o bairro floresta, na Secretaria Executiva Regional I, é pródigo em embaralhar as noções espaciais e geográficas de qualquer forasteiro

Havia um matagal onde foi construído o Conjunto Habitacional Floresta. Até hoje os animais habitam a região(Foto: Fco Fontenele) O Floresta é um bairro onde sagüis saltam dos galhos das árvores e se empoleiram nas cumeeiras das casas à procura de ovos de pardais. Em seguida, porque são muito pequenos e não aprenderam ainda a voltar pelo mesmo caminho que trilharam até ali, devem ser retirados do alto por meninotes que ontem mesmo estavam "pescando" camaleões às margens da lagoa do Urubu. No Floresta, policiais militares interrompem a ronda diária para dar um trato no cabelo no Salão de Beleza do Régis. Aberto das 8 ao meio-dia e das 14 às 20 horas, ele é o mais famoso gabinete da área. Nele, enquanto um PM embeleza-se, de frente para o espelho os demais espremem cravos e espinhas, conferem se o colete à prova de balas está mesmo rente ao peito ou as mangas da camisa preta em cujas costas lê-se "Força Tática" estão rigorosamente dobradas, expondo uma ou outra tatuagem.

No Floresta - que, na verdade, são dois: o de lá, do outro lado da lagoa do Urubu e o de cá -, o que resta de uma construção em alvenaria apelidada não por acaso de Muro de Berlim serve de anteparo a grupos de meninos que praticam pequenos delitos e depois se escondem no breu da noite, deixando os moradores em polvorosa. Lá, atendentes de supermercado e entregadores de farmácia se reúnem fora dos seus turnos de trabalho para jogar dama e, via TV a cabo, assistir ao desempenho das duplas femininas de vôlei de praia nas areias pequinesas. Nesse bairro, líderes comunitários atiram-se na frente dos ônibus de modo a forçá-los a cumprir o itinerário normal, esticado até a última casa do bloco G. Para eles, ainda que motoristas e cobradores temam os perigos do lugar, nenhum passageiro deve ser esquecido sob a sombra de alguma árvore.

Ainda no Floresta, todas as casas têm o mesmo número: 624, e as ruas, uma letra que vai de "A" até "G". Os apartamentinhos, por sua vez, têm apenas quatro opções de denominação: 1, 2, 11 e 12. Os dois primeiros números em baixo; os demais, em cima. Na mesma rua, portanto, há muitas moradas 1 ou 12. É plenamente possível que haja duas donas de casa chamadas Maria que residam no bloco E, casa 1. Pior para o carteiro, o entregador de gás ou alguém que displicentemente desça do ônibus Antônio Bezerra/Álvaro Weyne atrás da fábrica de transformadores e saia caminhando à toa pelas ruas.

Menos pela distribuição numérica das construções do bairro e mais por sua arquitetura, Francisco Manoel de Andrade, 43 anos, fiscal de trânsito e morador do Floresta, defende: "Isto aqui é como se fosse um condomínio fechado". As ruas de lá não têm propriamente nomes. "Você chama esta rua aqui de E, por exemplo, mas na verdade o bloco é que é E", desanuvia. No Floresta, as casas - sala, cozinha, banheiro e quarto apertados - pertencem a quadras. As quadras, a blocos. Batizados com as primeiras oito letras do alfabeto, os blocos distribuem-se paralelamente. São cortes transversais no quadrado formado pelas ruas Frei Odilon, Pedestre, Luiz Guimarães e uma última aparentemente sem nome. Segundo dados da Fundação de Desenvolvimento Habitacional de Fortaleza, a última rua não tem oficialmente denominação.

Não tem para a burocracia do município. Para Célio, espécie de Cristóvão Colombo do Floresta, a rua bem que podia se chamar "Loura". "Seria Rua da Loura", gargalha. A musa inspiradora do mecânico, que também atende pela alcunha de Louro - aos 51 anos, Célio tem cabelos claros esfiapados e olhos azuis - repousa dentro de casa, no quartinho que dá para o amplo quintal à beira da lagoa. Ela tem quase 10 anos, fios dourados caindo sobre os olhos saídos aos do pai. É a cria mais nova do casal Louro & Cléa, que divide os metros quadrados domésticos com Chico & Família.

Chico é um sagüi heterodoxo. Chegou à casa de Louro sem ser convidado, mas logo ganhou a confiança de todos. Após ter-se fixado e criado hábitos pelos quais ficou famoso, tratou de ganhar o mundo. "Ele ficou uns três ou quatro dias fora", relembra o mecânico. Quando voltou, trazia na algibeira uma esposa. A família de Louro assustou-se com a proeza do bichinho. Cheia de manha, a mulher de Chico também foi aceita no número 1 do bloco E. Ocorre que, semanas depois, Chico e cônjuge misteriosamente desaparecem. Nem maior, nem menor: o susto de Louro foi semelhante ao da primeira deserção do sagüi, quando ainda era solteiro. Seu novo retorno, porém, seria marcado por estupefação generalizada. "Ele chegou trazendo a mulher e um filho." De lá para cá, Chico tem se aquietado.

Louro também é o cartão de memória da comunidade. Desfia histórias com a mesma facilidade com que Chico dá escapadinhas. Ele conta: foi o primeiro morador a chegar ao Floresta. "Quando recebi as chaves, estava na Regional I consertando um carro." Fez a mudança no lombo de um Fusca, que vendeu para comprar o Fiat Elba 89. Ele narra: à falta de posto de saúde que atenda os moradores do lado de cá do Urubu, o galego pode ser surpreendido no meio da noite por alguma urgência. Num salto, põe-se de pé, veste-se ligeiro, corre até a garagem e gira a chave do carro. "Este carro aqui já carregou muito baleado, esfaqueado." Noutro momento, porém, Louro parece mesmo remexer as camadas mais fundas da identidade dos moradores do Floresta. Convidado a historiar, não resiste. Diz certeiro: "Aqui é Floresta porque só tinha mato". Pronto, acabou-se.


PERFIL
Localização: O conjunto habitacional Floresta fica entre os bairros Álvaro Weyne.
População: 28 mil habitantes.
Regional: SER I

Fonte: Jornal O Povo

DUNAS - Um condomínio de luxo

Pedro Rocha
da Redação


Era uma vez um bairro sem ônibus, comércio ou praça que seja. O antigo Dunas, hoje Manuel Dias Branco, abriga exclusivamente casas, condomínios fechados e uma imponente igreja. Próximo ao mar e longe o suficiente do caos urbano, o bairro é um dos mais ricos da cidade

O bairro Dunas ganhou o nome do empresário Manuel Dias Branco e tem um dos metros quadrados mais caros de Fortaleza (Foto: DARIO GABRIEL) A igreja de Nossa Senhora de Lourdes deita-se na areia, velando por um espigado de edifícios que se apertam lá embaixo, nos bairros que também atendem pelo nome genérico de Aldeota, na Secretaria Executiva Regional 2, Zona Leste de Fortaleza. O antigo bairro Dunas, atual Manuel Dias Branco, tem uma das vistas mais bonitas da cidade. Doutro lado, o mar da Praia do Futuro sopra um vento bom, o mesmo que mil anos atrás trouxe esses morros. A igreja, branca e imponente, lança-se ao céu tal qual os muros de seus vizinhos, ilustres moradores de um dos bairros mais ricos de Fortaleza.

"Aqui é bom. Aqui só mora de galeguinho pra cima, só gente alta, de dinheiro", fala o empresário José Mozart, 58, antigo morador e um dos paroquianos mais ativos. Hoje, as dunas ficam por debaixo do enfileirado organizado de casarões e condomínios fechados que não param de ser construídos numa das áreas mais valorizadas da cidade; ou então se esgueiram nos poucos terrenos não construídos que ainda restam.

"É uma zona em plena expansão. Naturalmente, ainda não é o mais caro, mas é um bairro que está em franco desenvolvimento e a procura por terrenos para condomínios fechados é muito grande. É um bairro em evidência em termos de moradia horizontal", informa Armando Cavalcante, presidente do Conselho Regional de Corretores de Imóveis (Creci). Os valores de um terreno na região giram em torno de R$ 400 a R$ 450 o m . Já o m construído não sai por menos de R$ 3 mil. "Você tem casa ali de até um 1 milhão e meio de reais, mas a média é na faixa de 600, 650 mil".

O crescimento é visível. Numa pacata tarde no bairro, encontram-se nas ruas apenas trabalhadores da construção civil. No mais, são caseiros, jardineiros e um homem à paisana com um rottweiler na coleira. Edifício aqui não sobe, é proibido. Mas é preciso andaimes altos para se pintar o muro de um dos mais novos condomínios. "Daqui pra cima é Dunas, daqui pra baixo, favela", demarca o pintor Haroldo dos Santos, 32, morador do Vicente Pinzón (ou Praia do Futuro II nos mapas da Prefeitura), que fica justamente do outro lado da avenida Trajano Medeiros, uma das divisas do bairro.

"Já botaram até os coqueiros", aponta o motorista Henrique Viana, 36, para a cortina de árvores rente ao muro, do qual é vizinho. "O problema maior pra eles lá é ficar com essa vista", conclui, referindo-se ao próprio Vicente Pinzón, onde também mora. A vantagem dali é que as casas, muitas sem reboco, antecedem as primas ricas e ainda podem colher vento. "As coisas que vêm de Deus ninguém empata", afirma segura dona Maria, mãe de Henrique.

Mas o dito talvez não calhe para os tais edifícios lá de baixo, mesmo que a vista da igreja de Nossa Senhora de Lourdes caia sobre eles. "As dunas amenizam o clima da cidade. Elas estão associadas às áreas onde há ventos. Quando se começa a construir sobre as dunas, mesmo sem edifício, começa a se originar o que se chama de rugosidade. As áreas adiante, onde o vento ia amenizar o clima, começam a sofrer com níveis de calor. Você privatiza o vento", alerta o professor do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Ceará, Jeovah Meireles.

As circunvizinhanças, por sinal, já foram um dos grandes problemas do bairro. Nos anos 1990, quando a ocupação ainda era incipiente, a região sofria com os constantes assaltos. O problema foi solucionado com uma organização autônoma dos moradores, que providenciaram segurança privada e sofisticados aparatos de vigilância eletrônica, sem falar nas quase onipresentes cercas elétricas.

"Na saída das missas, os vagabundos abordavam os carros nas avenidas", lembra Mozart. O clima de tranqüilidade é mantido por um segurança particular que se posta na entrada da igreja nas celebrações diárias das 18 horas. O guarda tem um sugestivo apelido: Messejana. Outro faz ronda em uma calçada próxima à igreja católica, empunhando um pastor alemão. O templo, construído principalmente com doações de empresários do bairro, ainda possui câmeras eletrônicas para no caso do resguardo divino falhar. Mesmo assim, outra paroquiana mais precavida faz questão de mandar um recado: "Você diga pros ladrões deixarem de andar por aqui".


PERFIL

População: 1.594
Localização: Ao norte, faz divisa com o bairro de Lourdes e o Papicu Tamanho: 468 hectares
Distância do Centro: 8,5 km

Fonte: Jornal O Povo

AUTRAN NUNES - Onde os bodes se perderam

Juliana Girão
da Redação


Localizado entre Antonio Bezerra, Henrique Jorge e Genibaú, periferia de Fortaleza, o bairro Autran Nunes é conhecido também pelo apelido de alto do bode. Mas também já foi chamado de Caoca e Alto do São Vicente


Um bairro com muitos nomes, Autran Nunes, vive um tempo muito diferente de quando era chamado de Alto do Bode. Com um aspecto quase rural, ainda é possível brincar na rua com os amigos e conversar com a cadeira na calçada (Foto: ALEX COSTA) No início, era tudo barro vermelho. E muito mato. Autran Nunes chamava-se Alto do Bode. E a fama não era das melhores. Diziam que lá só dava ladrão. E gente morta aparecia vez por outra no meio dos arbustos. A dona-de-casa Raimunda Sousa de Carvalho, 82, mais conhecida como Dona Calunga, sabe bem da história. Foi uma das primeiras a chegar ao bairro. Sentada no alpendre de casa, na rua Professor Virgílio de Moraes, 364, ela foi encontrada por acaso pelo O POVO. Coisa do destino. E lá estava a memória viva da região. Moradora do Autran Nunes há mais de 40 anos (ela já perdeu as contas do tempo exato), Raimunda mudou-se para o bairro com o marido Raimundo Gomes de Carvalho, apelidado à época como Gás, e mais sete filhos pequenos. O lugar era quase completamente desabitado. "Era como no sertão. Só tinha muito era cobra. Nesse tempo era tudo deserto. Não tinha nem estrada. Só tinha uma casa na frente. Não tinha cerca, não tinha nada", lembra.

No ido dos anos 1960, quando a iluminação do lugar era na base do botijão de gás, ela abriu um comércio que virou ponto de encontro. Segundo Raimunda, eram mais de 40 litros de refresco por dia que não davam conta da demanda. "Minha bodega era cheia de ladrão, mas eu não tinha medo não", conta. Nessa época, o bairro já era conhecido pela alcunha de Alto do Bode. Quem denominou, segundo Raimunda, foi o seu próprio marido (que morreu nos anos 1970 e hoje dá nome ao Centro de Aprendizagem e Integração de Cursos - Caic do bairro). Pelo menos uns 50 anos atrás, o casal morava ainda no bairro ao lado, o Antonio Bezerra, onde mantinha uma criação de cabras. Nesse tempo, o vizinho, que também criava bodes, sentiu falta de um par de novilhos. Deram conta de que os animais estavam amarrados no Alto do São Vicente (a região onde fica o atual Autran Nunes, que, num primeiro momento, ainda teve o nome de Caoca). Os novilhos não foram recuperados nem o ladrão localizado, mas a nova alcunha pegou (e o tom pejorativo também). Mais tarde, arrependido, finado Gás tentou de tudo para fincar o nome Alto do São Vicente com placas e faixas. Foi em vão. Depois, segundo Dona Calunga, o marido resolveu batizar o bairro com um novo nome: Autran Nunes, em homenagem a um juiz amigo.

Ainda hoje o lugar é lembrado pelo antigo apelido. "Não gosto não. Isso discrimina demais. O nome certo é Autran Nunes", diz a líder comunitária Dalvina Linhares da Silva, 60, moradora há 32 anos do bairro, que recebeu o Vida & Arte Cultura, na sua casa, na rua Tomaz Cavalcante. Ela lembra que, por muito tempo, até mesmo os taxistas se negavam a entrar nas ruas do bairro. Na parada de ônibus, ela ouvia piadas. Hoje a líder comunitária garante que a situação é bem diferente. "Aqui é tranquilo. Já foi mais violento. Antigamente (entre anos 1970 e 1980) tinha um forró nessa rua (Tomaz Cavalcante) que matavam muita gente. Hoje é dentro do normal. De vez em quando, tem brigas. Em 15 dias, matam um. Onde corre droga, corre violência", diz. Mas nem todo mundo quer enterrar a história dos bodes. "Eu continuo até hoje, apesar de ter mudado para Autran Nunes, considerando Alto do Bode. Eu acho até bonito", diz a comerciante Cosma Souza Carvalho, 46, filha de finado Gás e Dona Calunga. Com duas filhas para criar, Cosma mantém um bar ao lado da casa da mãe, mas só vende cachaça até às 10 horas da noite para evitar qualquer transtorno.

Apesar de tantas histórias de sangue, o bairro - que registra mais de 60 anos - parece uma cidadezinha de interior. Cadeira na calçada é o dia todinho. Conversa de comadre na janela e papo no pé do muro também. As pessoas ocupam as ruas. À pé, de bicicleta. Quase todo mundo se conhece. O horário da calmaria geral é ao meio-dia. O comércio fecha, as portas das casas também. Tudo fica na grade e no cadeado. É um silêncio só. Hora de almoçar e dormir um pedaço. (E proteger-se de qualquer tentativa de assalto, muito comum por essas horas). As construções modestas são todas coladas umas nas outras, formando uma paisagem irregular. A maior parte das casas é de alvenaria. Algumas de taipa são vistas às margens do rio Maranguapinho e da Lagoa do Genibaú. Nesta época do ano, quase todas as paredes estão pintadas pela propaganda de candidatos às eleições.

Mesmo com o pouco tráfego de veículos, até as ruelas são asfaltadas. As principais vias são a avenida da Liberdade, a rua Professor Virgílio de Moraes (a única por que passa linha de ônibus) e a rua Tomaz Cavalcante (onde fica o posto de saúde, duas igrejas católicas e uma creche). O ponto de encontro do bairro é a Praça da Lagoa. Aos domingos, dizem que o lugar fica lotado. Toca funk e falta espaço para a criançada brincar. Fim de tarde, a caminhada é no calçadão do rio Maranguapinho, ainda que poluído. O ganha pão da população local é mesmo o comércio. Tem de tudo. Oficina de bicicleta, borracharia, mercearia, bares, salão de beleza, papelaria, lanchonete, miudezas em geral. Tem o Studio Fashion Hair, MG Variedades, Mercadinho Francisco, Drink´s Bar, Bar Márcio e Oficina O Gerardo, entre outros tantos, muitos de porta e janela. "Hoje o Autran Nunes está bonito. Tá mais diferente. Tem ruas abertas, quase todas no asfalto. Tem escola de 2° grau, posto de saúde, praça. Iluminação tem por todo canto, saneamento. Tem o calçadão, que tá muito bonito. Quem te viu e quem te vê", orgulha-se Dalvina, ao lado do marido Expedito Neri, 71, funcionário público aposentado, com quem criou seis filhos.

À tardinha, o ritmo segue lento. Diante de um pôr-do-sol deslumbrante de alaranjado, a criançada brincava no parquinho na Praça da Lagoa do Genibaú, que divide um bairro do outro. Balanço, escorrega, campinho de futebol, pipa. O forró truava - sem incomodar ninguém - num bar do outro lado da rua, onde estava escrito na parede o agrado da casa: "panelada, sarrabulho, bisteca, caldo e calabreza" (assim com "z" mesmo). Um cavalo pastava sozinho na vegetação da lagoa, suja e quase seca. O churrasquinho começava a ser montado na calçada. O estudante Elineudo dos Santos, 10 anos, morador do bairro, era um dos que brincavam por lá. O menino posou para fotos com a camisa de Ronaldinho, número 10 da seleção brasileira de futebol. Como qualquer menino dessa idade, gosta de jogar bola. Logo depois da escola, a praça é o seu lugar. Dele e de tantos outros. Animados com a presença do fotógrafo, numa terça-feira qualquer, meninos e meninas posavam satisfeitos para as lentes. O dia se despedia e era hora de voltar. Com um bucólico Autran Nunes na cabeça.

Fonte: Jornal O Povo

domingo, 3 de agosto de 2008

Ser cearense é ser único. Ô orgulho véi besta...

O Jeito Cearense de Ser Único!

Cearense não briga... ele risca a faca!
Cearense não vai em festa... ele cai na gandaia!
Cearense não vai com sede ao pote... ele vai dicumforça!
Cearense não vai embora... ele vai pegá o beco!
Cearense não conserta... ele dá uma guaribada!
Cearense não bate... ele senta o sarrafo!
Cearense não sai pra confusão... ele sai pro balai de gato!
Cearense não bebe um drink... ele toma uma!
Cearense não joga fora... ele rebola no mato!
Cearense não discute... ele bota boneco!
Cearense não é sortudo... ele é cagado!
Cearense não corre... ele faz carrera!
Cearense não ri... ele se abre!
Cearense não brinca... ele fresca!
Cearense não compra garrafinha de cachaça... ele compra um celular!
Cearense não toma água com açúcar... ele toma garapa!
Cearense não calça as sandália.... ele calça as opercata!
Cearense não morre... ele bate a biela!
Cearense não exagera... ele alopra!
Cearense não percebe... ele dá fé!
Cearense não vigia as coisas... ele pastora!
Cearense não vê destruição... ele vê só o distroço!
Cearense não sai apressado... ele sai desembestado!
Cearense não observa... ele passa os pano!
Cearense não agarra a mulher... ele arroxa!
Cearense não dá volta... ele arrudêia!
Cearense não serve almoço... ele bota o dicumê na mesa!
Cearense não diz que fulano não é de confiança... ele diz que a mercadoria é sem nota!
Cearense não espera um minuto... ele espera um pedaço!
Cearense não é distraído... ele é avoado!
Cearense não fica encabulado... ele fica todo errado!
Cearense não comete gafe... ele dá uma rata!
Cearense não sobe na arvore... ele se trepa no pé de pau!
Cearense não passa a roupa... ele engoma a roupa!
Cearense não ouve barulho... ele ouve zuada!
Cearense não acompanha casal de namorados... ele segura vela!
Cearense não dá cantada... ele quêxa!
Cearense não é esperto... ele é desenrolado!
Cearense não é rico... ele é estribado!
Cearense não é homem... ele é macho ou é cabra danado!

Um canal de divulgação da politica, esporte, cultura e história do Ceará e do Nordeste.

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