domingo, 7 de março de 2010

Era uma vez uma rua e uma cidade


Praça do Ferreira , à época, numa perfeita harmonia entre o espaço físico e os interesses humanos - organismo vivo de nossa cidade
FOTO : ACERVO DE MARCINAO LOPES
7/3/2010


Na vida, temos, com o correr do tempo, variados momentos, em que cada um traz invisível marca de presença que vem, ao final de cada jornada, formar na sua época própria, para registrar o passar do tempo, tornando-se memória. E memória é, antes de tudo, a capacidade de repetir. Que tal nós percorrermos ruas e lembranças de nossa cidade?

Ah! tempo inexorável e pertinaz, que só tira a beleza de bem viver, a começar por fixar profundas rugas na face, vincada por longos lóbulos carnais tirando toda graça antes irradiante, hoje verdadeiro cemitério facial onde se acha sepultada a formosura do encantamento, que serviram de palco da alegria dos nossos sentidos tão intimamente entrelaçados a nossa mente, compunham o conjunto por nós criado e cultivado durante a nossa existência entre os seres que se amam, entrelaçam-se mutuamente transformando num só corpo e alma.

Com o passar de cada ano, vem de nós tomar conta a velhice velozmente, sem mesmo ser chamada, mas inevitavelmente como maior componente de nossa vida. Agora decadente, a nossa existência, a passos céleres ou galopantes, prostra-se, destruindo, inexoravelmente, toda nossa estrutura.

Dos mistérios

Quanta temeridade o mundo reserva aos mais diversos habitantes do hemisférico planeta? É bem melhor imaginar a ceia dos apóstolos naquela imensa mesa onde se repartem pão e vinho que alimentam corpo e alma, purificando corações diante daquela partilha por Jesus celebrada na Semana Santa. E a gente fica a pensar que o tempo demora a passar!...

Eis que, num sopro, chega-se ao término de mais um ano, deixando as lembranças ou ferindo mais profundamente as saudades, que ficam a magoar o coração já cansado de bater e sofrer os infortúnios da vida, mas também acalentado por momentos inesquecíveis que suplantam as dores e são enlevo, embora saudades fiquem de realce, emoldurando o tempo que chega repentinamente, e, sai sem dizer adeus

Refazendo novelos

Tudo tão ilusório, e, no engano dos nossos sentidos, deixa a nossa mente enleada pela fantasia nos parece tudo verdadeiro.

Mas tudo na vida tem o seu lado ilécebras, que nos enganam e mostram como somos frágeis diante da sedução que o mundo o oferece e fascina. Se voltarmos o pensamento para o passado,em direção a Fortaleza dos tempos que não retroagem, olhando para trás não tão distante, para relembrar com mais freqüências os fins de noites, iluminada por prateada lua dum céu salpicado por cintilantes estrelas, vagalumeando a abóbada celeste, num eterno piscar fosforescente em vigília noturna, nas saídas do encerramento das sessões dos cinemas frequentados por diferentes camadas sociais que se deslocavam no centro da cidade em busca de retorno a residência... Ah, quanta coisa, agora, estaria diante de nós, como inscrições, magicamente, refeitas!

Trilhando ruas

A começar pelos Cines Diogo e Moderno, que tinham uma frequência elitizada, cujas salas de espetáculos eram mobiliadas aos moldes dos cinemas do Rio de Janeiro; em seguida, o Cine Majestic, com entrada na Rua Barão do Rio Branco, frequentado, também, por diversas classes, pois não fazia exigência de trajes elegantes, nem calçados. ( Àquela época, em Fortaleza, a maioria não tinha sapatos, usava tamancos feitos de madeira, com plataforma de calcanhar elevado, semelhante aos tamancos usados pelos portugueses no Rio de Janeiro, os quais se dedicavam aos serviços braçais de empurrar carros com duas rodas para transportar mercadorias no centro da cidade.

Um tipo singular

Aqui na Rua Barão do Rio Branco, vizinho ao cine Majestic, havia uma fábrica de gelo da Empresa Ribeiro - Luis Severiano Ribeiro, cearense, percussor dos cinemas em quase todo Brasil. Um funcionário dessa fábrica de gelo percorria com seu carro de mão o centro da cidade vendendo barras de gelo, protegido com serragem (evitando dissolver rapidamente o gelo) para atender diversos estabelecimentos da cidade. Durante anos a fio, como funcionário da empresa Luis Severiano Ribeiro, dedicou-se a esse trabalho.

A singularidade desse personagem, por ser idoso, deficiente visual, dirigia transporte de risco para sua idade, merecia dos que guiavam carros, a devida consideração dando-lhe preferência o trafegar do seu carro de rodas aproveitada de veículos usados.

Sem embaraços se desvencilhava dos demais carros, conduzindo durante o expediente de trabalho, grande quantidade de barras de gelo para o comércio central. Outros transportavam diversas peças de tecidos, bobinas de papel em resmas de uma loja para outra, abastecendo lojas, armazéns, enfim um atendimento em forma de intercâmbio entre comerciantes ou abastecimento às filias, sem se falar nos famosos chapeados dos fins de quarteirões ou da Estação Ferroviária do Ceará - R.V.C. (Rede Viação Cearense).


Zenilo Almada
Colaborador
* Advogado

Da instabilidade do mundo

Se perguntarem alguma coisa sobre o ano que se findou, darei atualizada resposta plagiando a letra e música de Toquinho: "A vida tem sempre razão - A gente mal nasce começa a morrer - Sei lá, sei lá - A vida é uma grande ilusão..."

Entretanto nada tem a ver o enredo da música nem tampouco do conteúdo abordado. Apenas ouvindo-a, com certa atenção, notamos a sonoridade e a docilidade da composição, com a qual me deleito da musicalidade que sonoriza o estado de espírito, e, dão agradável suavidade, tornando momento inesquecível, atento, repondo o bem-estar de quem passou parte do tempo do dia numa azáfama do trabalho, exercitando a mente, nossa poderosa fonte de saber, de sentimento, enquanto a velhice não se aproxima de nós tomando conta, porque daí por diante termina nossa poderosa fortaleza, dos grandes feitos e domínios, embates e guerrilhas, vencendo os percalços que advém silenciosos, tornando-nos pigmeus, reféns do próprio destino.

E, vemos a velhice sorrateiramente chegar sem permissão, se aboletando e aquartelando na nossa mente, passando a comandar nossa pessoa, num processo de regressar até atingir a condição de criança.

E dessa luta imbatível vence o mais forte - o tempo. O tempo é inexorável e na impiedade de sua soberania não tem complacência nem posterga fatos. Consome com impetuosidade porque não sabe se apiedar do sofrimento dos seres. Para ele, tudo não passa de meros fragmentos soltos ao tempo, que se encarrega de voltar à sua origem - o pó.

Diz a Sagrada Escritura, segundo seus Apóstolos: "Tu és pó, e em pó te tornarás." Assim pensando na pequenez dos nossos cromossomos nada somos. Portanto não vale a pseudo aparência, todos nós somos iguais. Sem profundidade facilmente sabemos que, quando morremos, nossos restos se desintegrarão na mais pura metamorfose: do nada ser além de terra que se encarrega da nossa transformação biológica.

Fonte: Jornal Diário do Nordeste

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